CENSURA E PROPRIEDADE

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Tema sugerido pela amiga Carla RA. Obrigado, Carla.

Era uma vez um espaço de produção e compartilhamento de conhecimento, acessível ao mundo todo, livre de qualquer censura e preconceito. Esse foi o sonho de muitos românticos que viveram os primeiros passos da Internet.

Mas, não tardou ficar claro que a verdade passa longe disso. Na medida que a Internet se popularizou, vimos que boa parte do público está mais interessada em fofoca de celebridades ou vídeos de gatinhos do que em conhecimento útil. E quem quer trocar ideias geralmente prefere se organizar em bolhas com os que pensam igual a si para louvar as próprias teses e xingar quem pensa diferente.

Daí, surgiram as redes sociais e seus algoritmos baseados em likes e reforçaram o sentimento e o comportamento tribal. Esse é o pano de fundo do cenário atual onde vemos cada grupo buscando formas de limitar a voz e a visibilidade dos grupos rivais.

Essa caça à liberdade de expressão alheia se dá em duas frentes. Uma delas é a censura estatal, seja através de projetos de lei nos parlamentos, de decretos dos executivos ou de sentenças e mandados emanados do judiciário. Busca-se, através da força do estado, impedir que opositores digam o que pensam, evitar que autoridades sejam criticadas, criminalizar opiniões, punir o pensamento discordante. Essa frente da censura estatal é execrável e deve ser repudiada e combatida por qualquer pessoa que preze por liberdade.

Mas há uma segunda frente de contenção da expressão alheia. Empresas que lidam com informação selecionam a quem darão voz, quais ideias terão espaço, qual o alcance cada manifestação terá. Redes como Facebook, Twitter, Instagram e outras tem suas políticas, selecionam o que vão repercutir e mesmo quem pode ser usuário. Jornais, revistas e portais selecionam seus jornalistas e colunistas e os submetem a políticas editoriais. Essas seleções não são isentas, envolvem critérios econômicos, políticos e ideológicos, entre outros. E isso é legítimo. A autonomia de cada empresa ao administrar sua propriedade privada também deve ser respeitada por quem gosta de liberdade.

Claro que a censura privada também impacta a sociedade, também priva as pessoas de alguns conteúdos e exagera a importância de outros, também distorce verdades, também promove mentiras. Devemos deixar isso quieto em nome da liberdade? Não. Mas, desafios privados à liberdade devem ser enfrentados de maneiras distintas.

Primeiro, quem se sente diretamente prejudicado tem a opção de buscar na justiça indenizações civis e condenações criminais.

Segundo, o bom do ambiente privado é que há espaço pra concorrência. Nem toda rede social é igual, nem todo jornal tem a mesma linha editorial. Cada um faz um recorte distinto, cada um é seletivo de um jeito diferente. Além disso, por maior que seja um império, ele nunca está a salvo das invasões bárbaras. Todo dia tem uma nova rede social sendo lançada, algum empreendedor tentando emplacar a próxima grande rede. Todo dia tem alguém trocando um grande jornal por um blog, um canal de vídeo, um jeito qualquer de propagar um ponto de vista barrado por um grande editor.

Cabe a quem vê a liberdade como uma causa válida ser cético, buscar fontes variadas de informação, duvidar tanto daqueles com quem sempre concorda quanto daqueles de quem sempre discorda. A verdade raramente está toda nos extremos. Vale também ficar de olho nos novos empreendimentos, sejam redes, sites, blogs, revistas, ou algo no qual ninguém tinha pensado antes. É bom ver quais parecerem mais promissores, incentivar com consumo, divulgacao e participação. E, quem sabe, seja hora de ter sua própria iniciativa, de criar novos canais de comunicação e compartilhamento de informações. Mais importante do que achar a solução perfeita é achar uma que funcione e ajudar a aperfeiçoá-la.