VACINA

É possível ser favorável à vacinação em massa, ser um entusiasta das vacinas e, ao mesmo tempo, ser contra a vacinação obrigatória, ser contra o uso da força para coagir pessoas a fazer algo em relação ao qual elas não estão se sentindo seguras.

É possível estar ansioso para ver prontas pra uso vacinas desenvolvidas e produzidas com rigor científico em países democráticos e, ao mesmo tempo, ser cauteloso em relação à vacinas feitas às pressas e sem transparência por governos de ditaduras sinistras.

Já transformamos uma pandemia numa briga político ideológica em que a razão tem sido a maior perdedora. Seria bom não transformarmos a vacina nisso também.

Respeito à liberdade alheia, responsabilidade no trato com a vida das pessoas e relações humanas baseadas no consentimento são sempre bem vindas, especialmente de quem tem cargos de liderança e gestão pública.

O PRESIDENTE DA SUÍÇA

Você sabe quem é o presidente da Suíça? Provavelmente não. Pode citar pelo menos um presidente suíço famoso em algum momento da história? Poucos poderão. Mas, você já ouviu falar dos chocolates suíços, dos queijos suíços, dos relógios suíços, dos bancos suíços. A Suíça não é um país irrelevante no cenário internacional. Por que, então, seus presidentes não são celebridades?

É porque o que importa é a Suíça, o povo suíço, o desenvolvimento da Suíça, o bem estar do povo suíço e não a fama ou a mitificação de seus líderes.

No dia que o Brasil e os brasileiros forem mais relevantes que Bolsonaros, Lulas, Juscelinos, Getúlios ou Pedros, estaremos mais perto de sermos uma sociedade civilizada.

“MINHA VONTADE É ENCHER SUA BOCA DE PORRADA”

Vejo a mídia e as redes sociais fervendo com a fala do presidente a alguém que o abordou durante uma caminhada. Vídeos circulam aqui e acolá. Uma pergunta sobre cheques é repetida em uníssono. Afirmações contrárias à existência da tal pergunta são declaradas fake news por agências de fact checking. Fico com vontade de dar meus pitacos. Seguem.

1. A frase é agressiva, mostra desequilíbrio emocional, é inapropriada para um presidente da república dizer em público, independente de quais sejam os motivos que o levaram a dizê-la.

2. Nos vídeos que circulam, só se ouve a frase do presidente. Não consegui achar nenhum em que se possa ouvir a pergunta ou comentário que o levou a reagir assim.

3. Assumir que o que provocou a reação dele foi uma pergunta sobre cheques depositados na conta da esposa, só porque alguém disse que é, é leviano e tendencioso.

4. Se a cena foi filmada a frase que provocou a reação também deveria estar audível. A ausência da frase é suspeita.

5. As tentativas de partidários do presidente de colar outra frase no lugar, alegando que a resposta foi sobre uma provocação maldosa sobre a esposa ou a filha, sem apresentar prova, também são levianas e tendenciosas.

6. Deveríamos ser menos crédulos sobre o que dizem políticos, jornalistas e influenciadores. Em tempos de celular e internet, não é difícil checar se há evidências do que foi dito.

7. Se corrermos a acreditar no foi dito só porque vem de encontro as nossas impressões prévias sobre os personagens envolvidos, vamos ser enganados sempre.

PRECISAMOS FALAR SOBRE PREVIDÊNCIA

(Leitura: 15 min)

PREÂMBULO

Escrevi esse artigo durante a última reforma da previdência. Infelizmente, as reformas de previdências estaduais ora em debate me lembram que ele continua atual e necessário. Ainda mais nesses tempos de pandemia.

As diversas reformas da previdência que foram feitas ao longo dos anos têm pontos positivos. Tem pontos problemáticos também. Mas, o mais importante é o que elas não têm. Elas nunca passaram nem perto de abordar os principais absurdos e as principais injustiças de nosso sistema previdenciário. E são esses problemas que tornam nosso sistema previdenciário injusto e ilegítimo, uma verdadeira máquina de transferir dinheiro de trabalhadores sofridos para pessoas privilegiadas. Ademais, o que essas reformas fazem mesmo é jogar para mais adiante as urgências e fazer com que os trabalhadores atuais tenham que trabalhar por ainda mais tempo, se aposentando mais tarde e recebendo menos, para continuarem pagando mais e por mais tempo os privilégios de pessoas que já estão, hoje, recebendo benefícios injustos e imorais.

Sem encarar tais flagrantes absurdos e injustiças, qualquer reforma, mesmo com pontos positivos, acaba sendo ilegítima. E o que seria uma reforma justa e legítima, na minha opinião? Vamos ao esboço dela sem mais delongas.

PROPOSTA

  1. Toda pessoa maior de 21 anos que ainda recebe pensão pela morte de pai ou mãe, terá sua pensão cancelada imediatamente.
  2. O valor máximo de aposentadoria paga pelo INSS passará a ser o teto do Regime Geral de Previdência Social (valor atual 6.101,06). Toda aposentadoria que ultrapassá-lo será reduzida para este valor na data em que a reforma entrar em vigor.
  3. Toda pessoa que tiver se aposentado com idade menor do que a mínima (65 anos seria um bom número, mas, pode ser outro) terá sua aposentadoria revista. Se ainda tiver menos que a idade mínima na data que a reforma entrar em vigor, a aposentadoria será cancelada e a pessoa terá que se aposentar novamente quando completar a idade mínima. Se já tiver mais do que a idade mínima, a aposentadoria será mantida mas o valor será recalculado com base no tempo efetivo de contribuição e nos valores contribuídos.
  4. A partir de agora, todo mundo terá que esperar até atingir a idade mínima para se aposentar. No entanto, uma vez que atinja um tempo mínimo de contribuição (35 anos seria um bom número mas pode ser outro), não precisará mais contribuir.
  5. O valor das aposentadoria passará a ser indexado à arrecadação do INSS. Será criado o índice IN$$. No momento que a reforma entrar em vigor todas as aposentadorias, depois de ajustadas com base nos quatro itens anteriores, serão convertidas em IN$$, com valor inicial igual à menor aposentadoria em vigor no pais. Ou seja, a menor aposentaria será de IN$$ 1,00 e a maior de IN$$ 5,84. Todo mês, o valor do IN$$ será recalculado com base na arrecadação do INSS no mês anterior, subtraindo-se as despesas de custeio do sistema e dividindo-se o total restante em R$ pelo total a ser pago em IN$$ e então se terá o valor do IN$$ para o mês.
  6. Essa reforma valerá para todos os brasileiros, sem exceções.

JUSTIFICATIVA

As vantagens de um sistema assim, considerando o todo da população brasileira, são muitas. Porém, algumas saltam aos olhos:

  • É justo. Todo mundo paga pelas mesmas regras. Todo mundo recebe pelas mesmas regras. Não tem mais essa coisa de um trabalhador passar uma vida inteira ralando para ajudar a pagar a aposentadoria milionária de um político ou burocrata privilegiado que se aposentou cedo e, quando finalmente se aposentar na velhice, receber muitas vezes menos do que os super-aposentados que carregou nas costas por décadas.
  • Não tem déficit. O sistema paga com base no que foi arrecadado. Desequilíbrio atuarial zero.
  • É simples, objetivo e transparente. Qualquer um entende o que tá pagando e de que forma vai receber. Pode ser facilmente monitorado por toda a população brasileira. Não será mais preciso especialistas (que nunca concordam entre si) para nos dizer se há ou não déficit.

Acho importante ainda salientar que esse texto se trata de um esboço do que deveria ser os pontos centrais de uma verdadeira reforma da previdência. Não há a pretensão de ser preciso em termos técnicos ou jurídicos. O foco é na essência do que deve ser reformado na busca de justiça, equilíbrio e eficácia.

PERGUNTAS E RESPOSTAS

Imagino que quem leu até aqui esteja pensando em uma série de questões e considerações sobre a proposta. Vou já antecipar algumas que me ocorrem e buscar comentá-las.

Mas as mudanças que você propõe não são inconstitucionais? E o direito adquirido, como fica?

Muito pelo contrário. A reforma que proponho visa exatamente implementar os princípios definidos na nossa constituição. Vejamos o que diz a CF/88:

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana;

Agora, me digam, uma pessoa que trabalha desde a adolescência até os 65 anos de idade (talvez mais, já que cada arremeto de reforma que aprovam aumenta mais esse limite) para poder se aposentar com um salário mínimo e, durante todo esse tempo, contribui para bancar a aposentadoria de gente que recebe 20 mil reais, 30 mil, as vezes mais de 50 mil reais por mês tendo se aposentado muito mais cedo, as vezes com apenas 8 anos de mandato em cargo eletivo, as vezes sem nunca ter trabalhado na vida, alguém realmente acha que essa pessoa está tendo sua dignidade humana respeitada? Eu acho que não. Precisamos reformar, de verdade, esse sistema exatamente para promover a dignidade dos trabalhadores brasileiros que a CF/88 consagrou como princípio já em seu primeiro artigo.

Mas, não para por aí, outros princípios básicos da constituição andam sendo flagrantemente violados e necessitam serem implementados. Vejamos o título dos direitos e garantias fundamentais:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”

Ora, todos são iguais perante a lei. Então, por quê alguns brasileiros deveriam ter o direito a um sistema de previdência próprio, bancado pelo trabalho dos demais brasileiros? Será que o fato de a pessoa passar em um concurso ou vencer uma eleição dá a ela o direito de ser tratada por um conjunto distinto de leis? Dá a ela o direito de ser uma exceção ao Art. 5o da constituição? Pior, será que ser filho ou filha de alguém que um dia passou num determinado concurso dá à pessoa esse direito? Acho que não. O fato de algumas pessoas estarem recebendo poupudas rendas mensais as custas dos demais trabalhadores brasileiros é uma violação direta e imediata à CF/88 que precisa ser imediatamente corrigida se quisermos de fato ser um verdadeiro estado de direito.

Mas, alguém sempre pode lembrar que o Art. 5o que acabei de citar também tem esse inciso:

“XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

Será que este inciso pode contrariar o caput do artigo e permitir que a lei dê privilégios especiais para algumas pessoas? Ou, ainda, pode esse inciso contrariar o Art. 1o e permitir que a lei viole a dignidade dos trabalhadores brasileiros em nome de um suposto direito adquirido, em nome de uma injustiça que foi colocada na lei em algum momento do passado e que condena todo brasileiro que nasce hoje numa família de classe baixa a passar a vida toda pagando uma pensão nababesca para alguém que está vivendo a bem mais tempo que ele, pouco ou nada trabalhou e, por força de alguma injustiça, mesmo que escrita na lei, ganhou uma pensão mensal absurda sem ninguém dizer de onde sairia o dinheiro, apenas assumindo que os trabalhadores do futuro seriam obrigados a pagar essa conta? Eu acho que não. Isso não é direito adquirido, é escravidão. Ninguém pode ser condenado a passar a vida pagando os privilégios de outros, a passar a vida bancando a outros privilégios que a própria pessoa nunca terá. A escravidão foi abolida 1888, será que esquecemos isso? Aliás, já que estamos falando de impor esse absurdo a pessoas que nem sequer nasceram, devemos lembrar que pra esses a escravidão foi abolida ainda antes, 1871, pela Lei do Ventre Livre.

Você não vai propor nenhuma mudança nas idades mínimas ou nos tempos mínimos de contribuição?

Essas questões são importantes, mas, ficam em segundo plano. Uma vez que estejam implementados os items acima e eliminado tanto o déficit quanto as injustiças, as questões de idade mínima e tempo mínimo de contribuição, bem como outros pontos relevantes, tais como aposentadoria rural e benefício de prestação continuada, poderão ser rediscutidos não em função de caber ou não no orçamento, mas, em função de serem ou não justos e em função de seus impactos no equilíbrio entre os diversos membros do sistema.

E as alíquotas para contribuição para a previdência, como que fica?

Assim como as idades mínimas e tempos mínimos de contribuição, podem ser ajustadas posteriormente, com calma. Só não podem subir, pra ninguém, em hipótese alguma. O estado já nos toma dinheiro demais.

E a capitalização? Sua proposta não inclui a capitalização?

Capitalização é ótimo. A todo mundo que quiser complementar sua aposentadoria eu sugiro procurar uma instituição de previdência privada e começar um plano de investimento. Porém, o mercado privado pode perfeitamente dar conta disso. Ao Estado, cabe apenas zelar pelo cumprimento dos contratos, disponibilizando um sistema de justiça eficiente e acessível. Gerir planos de aposentadoria por capitalização não é tarefa para o Estado. Nossa história nos ensina muito bem no que dá colocar uma montanha de dinheiro na mão do Estado e esperar que os agendes dele façam bons investimentos de longo prazo com a grana.

Você mesmo poderá se aposentar antes dos 65 anos de acordo com as regras atuais. Vai abrir mão disso?

Se uma reforma semelhante à que proponho para o bem da sociedade brasileira for aprovada eu espero minha vez até os 65 de bom grado. Porém, se as regras atuais ou semelhantes forem mantidas, eu quero o meu benefício o mais rápido possível. Me considero uma pessoa justa, porém, não me considero um trouxa.

Os deputados e senadores que devem aprovar tal proposta são eles próprios membros proeminentes do grupo que tem super aposentarias ou estão prestes a obtê-las. Faz sentido imaginar que eles votem uma mudança que irá tirar-lhes esse direito?

Ora, se eles desejam impor regras novas aos trabalhadores que pagam a conta, eles devem ser os primeiros a aceitar essas regras. É uma questão de exemplo, de justiça, de coerência, e sobretudo, de legitimidade. Claro que é difícil promover mudanças que contrariem interesses exatamente de quem é autoridade em um ambiente democrático. Não sou ingênuo a ponto de achar que é fácil. Mas, não devemos aceitar menos. E é importante lembrar que somos nós trabalhadores que pagamos essa conta. Fingir que o problema não existe não vai resolvê-lo. Conformar-se também não. Expor a verdade é um primeiro passo.

Mas, pensa numa pessoa velhinha que já está acostumada a viver com uma renda mensal de, digamos, 12 mil reais por pês. Você quer agora chegar e obrigá-la a viver com pouco mais de 6 mil reais por mês?

Se essa pessoa passou a vida toda ganhando um alto salário, seja como funcionário público ou aposentado, ela poderia perfeitamente ter formado um patrimônio que lhe permita tranquilidade na velhice. Se não o fez, merece ter uma velhice mais frugal. De todo modo, ninguém tá falando em deixar essa pessoa na miséria, ela continuará aposentada, só que recebendo um valor semelhante aos demais brasileiros.

Mas, o funcionário público que recebe uma super-aposentadoria é porque contribuiu para o seu regime próprio de previdência com valores acima das contribuições que os trabalhadores do regime geral contribuem.

Não, não contribuiu. É importante lembrar que não estamos falando de técnicos municipais que ganhem dois ou três salários mínimos. Essas pessoas não serão afetadas a não ser, talvez, pela idade mínima. Estamos falando de políticos e funcionários públicos do judiciário, do legislativo e de cargos específicos do executivo que ganham dezenas de milhares de reais por mês, valores muito acima de cargos semelhantes na iniciativa privada. Essas pessoas contribuem para seus regimes próprios de previdência formalmente falando, mas, na prática, isso é apenas um malabarismo contábil. O dinheiro que elas recebem todos os meses saiu do cofre do estado, então, o que apareceu no contracheque delas como contribuição previdenciária foram apenas valores que deixaram de sair dos cofres públicos, ou seja, apenas se diminuiu um pouco a transferência de dinheiro dos pagadores de impostos para esses privilegiados.

A SOCIEDADE CALA, A ESCOLA FALA

Trabalhei por quase 15 anos em duas escolas simultaneamente, de manhã a pública e a tarde a privada. Na pública conheci o Léo e na privada o Vítor. Léo era o mais velho de quatro irmãos, pai preso, mãe diarista. Quando o conheci tinha 8 anos de idade. Vitor era o mais velho de 2 irmãos, também com 8 anos. Pai e mãe dentistas, consultório em bairro chique. Léo morava em barraco pequeno, de dois cômodos e quase sempre só comia na escola. Vitor morava em condomínio de Luxo, ia pra escola depois de tomar café e almoçar. Ao chegar em casa jantava e tomava leite antes de dormir. Léo, com dez anos cuidava da casa e quando tinha comida, cozinhava, pois a mãe trabalhava o dia todo fora. Vitor, até a última vez que o vi, já adolescente, não sabia lavar uma louça. Léo fazia a lição sozinho e ainda ajudava os irmãos menores. Vitor sempre contou com a ajuda da tecnologia e dos pais. Aos finais de semana Leo brincava com os irmãos na rua e cuidava da casa. Aos finais de semana Vitor frequentava buffets, shoppings, restaurantes. Léo nunca fez um curso extra, pois precisava ficar em casa para mãe trabalhar. Vitor sempre fez inglês, francês, natação e guitarra. Com 13 anos Leo precisou trabalhar na vendinha do bairro para ajudar em casa. Vitor ganhava uma mesada de R$ 200,00. A mãe de Léo se envolveu com um cara da pesada e acabou sendo presa. Vitor sempre contou com o apoio e suporte de uma família unida, equilibrada e presente. Quando Leo completou 15 anos seus irmãos foram para um abrigo e ele ficou com um parente próximo. Aos 15 anos Vitor ganhou uma viagem para o exterior. Na casa nova, Leo precisou ajudar com as despesas trabalhando período integral, deixou a escola temporariamente. Vitor entrou em universidade renomada totalmente financiada pelos pais. Não sou mais professora nessas escolas, mas colegas que ainda trabalham lá me deram notícias atuais: Leo hoje trabalha no IFood durante o dia para pagar um curso técnico que faz a noite e o Vitor acabou de se formar em engenharia. E ainda tem gente nesse mundo que defende a meritocracia! O Léo é só uma história entre milhares. Um garoto que se esforçou muito, mas encontrou diversos obstáculos pelo caminho que trilhou a pé descalço em chão de terra (enquanto o colega Vitor viajava de “jatinho particular”). O Léo vai chegar ao destino e se formar, eu tenho certeza disso, mas por causa de uma sociedade injusta e desigual, o menino vai levar o triplo do tempo e precisar do triplo de força pra não desistir… Quem usa o argumento da meritocracia, pra mim, é porque nunca conheceu a realidade das nossas periferias de verdade. Fala de algo que não existe! E, pior, coloca um peso enorme nas costas de quem já sofre. Isso se chama tortura!” – Postado por uma professora.

Meus comentários:

1. Vitor não tem culpa pela situação de Léo.
2. As circunstâncias difíceis que Léo enfrenta não são causadas pelas circunstâncias fáceis que Vitor vivencia, nem vice-versa.
3. Igualar todo garoto rico a Vitor e todo garoto pobre a Léo é preconceito. Nem toda família rica é bem estruturada e cuidadosa com os filhos como o texto sugere que a de Vitor é. Nem toda família pobre é desestruturada levando os filhos à uma situação de abandono como a de Léo.
4. Usar esse texto para criticar a meritocracia é desconhecer o conceito. Meritocracia não é sobre todos saírem do mesmo lugar, nas mesmas condições e buscarem os mesmos resultados. Isso é gincana. Meritocracia é sobre fazer o melhor, com os recursos de que se dispõe, buscando a realização de interesses pessoais. Pelo texto, tanto Vitor quanto Léo têm muitos méritos.
5. Se quisermos ver menos Léo’s no nosso país, precisamos entender os motivos pelos quais temos tantos. E tem que ver os motivos reais, específicos, não basta se acomodar a narrativas genéricas como “sociedade injusta e desigual”. E então poderemos atuar para diminuir os obstáculos e aumentar as oportunidades.
6. Eu tenho convicção, e aí é uma opinião pessoal, que não é dando cada vez mais dinheiro para o governo supostamente fazer projetos sociais para os Léo’s enquanto a maior parte dos recursos se perdem em ralos de corrupção e ineficiência que vamos melhorar esse quadro. E muito menos vamos melhorar as coisas culpando e caçando os Vitor’s.

Os posts da categoria “Respostas Abertas” comentam textos alheios que me chamaram a atenção em alguma rede social. O post original é a parte transcrita em “itálico”. O autor é citado quando possível. Se o texto for seu e não te dei crédito ou você não permite a transcrição, favor entrar em contato.

CENSURA E PROPRIEDADE

(Leitura: 5 min)

Tema sugerido pela amiga Carla RA. Obrigado, Carla.

Era uma vez um espaço de produção e compartilhamento de conhecimento, acessível ao mundo todo, livre de qualquer censura e preconceito. Esse foi o sonho de muitos românticos que viveram os primeiros passos da Internet.

Mas, não tardou ficar claro que a verdade passa longe disso. Na medida que a Internet se popularizou, vimos que boa parte do público está mais interessada em fofoca de celebridades ou vídeos de gatinhos do que em conhecimento útil. E quem quer trocar ideias geralmente prefere se organizar em bolhas com os que pensam igual a si para louvar as próprias teses e xingar quem pensa diferente.

Daí, surgiram as redes sociais e seus algoritmos baseados em likes e reforçaram o sentimento e o comportamento tribal. Esse é o pano de fundo do cenário atual onde vemos cada grupo buscando formas de limitar a voz e a visibilidade dos grupos rivais.

Essa caça à liberdade de expressão alheia se dá em duas frentes. Uma delas é a censura estatal, seja através de projetos de lei nos parlamentos, de decretos dos executivos ou de sentenças e mandados emanados do judiciário. Busca-se, através da força do estado, impedir que opositores digam o que pensam, evitar que autoridades sejam criticadas, criminalizar opiniões, punir o pensamento discordante. Essa frente da censura estatal é execrável e deve ser repudiada e combatida por qualquer pessoa que preze por liberdade.

Mas há uma segunda frente de contenção da expressão alheia. Empresas que lidam com informação selecionam a quem darão voz, quais ideias terão espaço, qual o alcance cada manifestação terá. Redes como Facebook, Twitter, Instagram e outras tem suas políticas, selecionam o que vão repercutir e mesmo quem pode ser usuário. Jornais, revistas e portais selecionam seus jornalistas e colunistas e os submetem a políticas editoriais. Essas seleções não são isentas, envolvem critérios econômicos, políticos e ideológicos, entre outros. E isso é legítimo. A autonomia de cada empresa ao administrar sua propriedade privada também deve ser respeitada por quem gosta de liberdade.

Claro que a censura privada também impacta a sociedade, também priva as pessoas de alguns conteúdos e exagera a importância de outros, também distorce verdades, também promove mentiras. Devemos deixar isso quieto em nome da liberdade? Não. Mas, desafios privados à liberdade devem ser enfrentados de maneiras distintas.

Primeiro, quem se sente diretamente prejudicado tem a opção de buscar na justiça indenizações civis e condenações criminais.

Segundo, o bom do ambiente privado é que há espaço pra concorrência. Nem toda rede social é igual, nem todo jornal tem a mesma linha editorial. Cada um faz um recorte distinto, cada um é seletivo de um jeito diferente. Além disso, por maior que seja um império, ele nunca está a salvo das invasões bárbaras. Todo dia tem uma nova rede social sendo lançada, algum empreendedor tentando emplacar a próxima grande rede. Todo dia tem alguém trocando um grande jornal por um blog, um canal de vídeo, um jeito qualquer de propagar um ponto de vista barrado por um grande editor.

Cabe a quem vê a liberdade como uma causa válida ser cético, buscar fontes variadas de informação, duvidar tanto daqueles com quem sempre concorda quanto daqueles de quem sempre discorda. A verdade raramente está toda nos extremos. Vale também ficar de olho nos novos empreendimentos, sejam redes, sites, blogs, revistas, ou algo no qual ninguém tinha pensado antes. É bom ver quais parecerem mais promissores, incentivar com consumo, divulgacao e participação. E, quem sabe, seja hora de ter sua própria iniciativa, de criar novos canais de comunicação e compartilhamento de informações. Mais importante do que achar a solução perfeita é achar uma que funcione e ajudar a aperfeiçoá-la.

NATURAS, THAMMIES, TRANS E TOFOLLIS

A Natura é uma empresa privada e pode estrelar suas propagandas com o que ela quiser, seja homem, mulher, trans, capivara ou árvore. Comprar ou não produtos da natura é escolha de cada um. E é direito de cada um elogiar ou criticar, comprar mais ou boicotar.

O que assusta do noticiário recente é o presidente da Corte Suprema achar que ele e a instituição que ora preside são editores do país, que têm o direito de controlar o que os brasileiros dizem. Talvez queiram controlar também o que pensamos.

Como ainda não nos foi de todo cassado o direito de dizer o que pensamos, digo o que penso do conceito de pessoa trans. O comportamento sexual de uma pessoa é assunto dela. Bem como seu modo de se vestir, de se apresentar, de se comportar, enfim, suas escolhas de vida não são da conta de ninguém. Se uma pessoa do sexo masculino quer transformar seu corpo e seu comportamento a ponto de parecer uma mulher, está em seu direito. Porém, quando a pessoa quer impor, pela força do estado, que os outros a reconheçam como mulher, passou do ponto. Mulher é um conceito já bem definido. Já que a pessoa não quer ser considerada homem, que crie para si um novo conceito. Exigir para si o conceito de mulher é uma violência porque esse já tem dono, já é a identidade de um grupo bem definido. A pessoa pode se apresentar como mulher pra si mesma, pode até buscar convencer outras a lhe dar tal título, mas, obrigar a todos a aceitar tal ficção está errado. E fica ainda mais complicado quando a pessoa pleiteia o reconhecimento civil e as consequentes diferenciações de tratamento por parte do estado. O mesmo vale para uma pessoa do sexo feminino que faz o caminho oposto.

Cada indivíduo deve ser livre pra viver sua vida como melhor lhe convier. Cada grupo deve ser livre para construir seus espaços, realizar suas aspirações e serem respeitados. Porém, ninguém tem o direito de invadir um espaço que já é de outro, nem modelar o pensamento alheio, tanto no nível individual quanto social. Quer mudar o pensamento dos outros, seja sobre o mundo ou sobre você mesmo? Convença-os, obtenha o consentimento deles para os seus pleitos. Impor sua narrativa à força ou colonizar um território que já tem outro dono não é progresso, é só mais uma ciclo de violência.

QUEM FOI HUMILHADO?

Vejo os jornais cheios de manchetes do tipo “Desembargador humilha guarda municipal em Santos” ou variantes dessa frase, onde se detalha o caso de um desembargador que, ao ser multado por não estar usando máscara ao caminhar em via pública, se irrita, chama o fiscal de analfabeto, liga para o Secretário de Segurança do Município, rasga a multa e tenta intimidar o fiscal com a famosa frase brasileira “Você sabe com quem está falando?”.

Pode-se discutir se decretos municipais obrigando o uso de máscaras são ou não constitucionais e outros pontos jurídicos e sociais relativos ao uso obrigatório de máscara em geral, mas, esse post não é sobre isso. O que me chamou atenção foi o recorrente uso da palavra HUMILHAÇÃO nas machetes de jornais e sites de notícias.

Acredito que a imprensa deve ser livre pra se expressar do jeito que achar melhor e o Estado só deve interferir via judiciário se alguém que se sinta prejudicado reclamar. Isso devia ser óbvio mas é sempre bom relembrar. No entanto, isso não impede que critiquemos a imprensa e a responsabilizemos pelas percepções que ela gera nas pessoas.

Acho o verbo humilhar extremamente inadequado para descrever o que ocorreu. O que vemos é um fiscal fazendo o trabalho para o qual é pago, agindo de forma profissional diante de um cidadão mal educado, arrogante, prepotente e, ao que tudo indica, um péssimo funcionário público, que usa seu cargo como um suposto título de nobreza fora de época, que deveria ser julgado e punido adequadamente, coisa que não vai acontecer porque nossas leis são lenientes com funcionários públicos ruins, especialmente quando pertencem ao judiciário. Porém, o fiscal não tem nenhum motivo para sair da cena humilhado. Pelo contrário, ele tem motivo é pra sair satisfeito consigo mesmo e ser elogiado por sua conduta e profissionalismo neste caso.

Acredito que a imprensa presta um desserviço ao criar essa narrativa de humilhação. Dá ao agressor um poder ao qual ele não faz jus. Dizer que o desembargador humilhou alguém é reconhecer nele uma suposta superioridade que ele não tem, é fazer dele um senhor de pessoas quando ele é apenas um funcionário público, cuja função é servir e não exigir. Só se humilha quem se permite se humilhar. Um funcionário público que está fazendo seu trabalho como o fiscal não tem motivo pra se sentir humilhado. Ao insuflar tal narrativa a imprensa incentiva uma atitude vitimista e perde a oportunidade de promover valores positivos e estimular a auto estima dos trabalhadores honestos.

ARMAS

“Adolescente mata amiga com tiro acidental após pegar arma do pai em condomínio de luxo em Cuiabá” – g1.globo.com, 13-Jul-2020.

Pessoas morrem em acidentes de carro. O que fazemos? Criamos iniciativas pra melhorar a educação para o trânsito ou proibimos os carros?
Pessoas morrem em acidentes com a rede elétrica. Criamos campanhas educativas ou proibimos o uso de eletricidade?
Pessoas morrem afogadas. Investimos em educação e salva-vidas ou proibimos banhos de mar e piscina?
Alguma atividade útil ou prazerosa pras pessoas envolve alguns perigos. Educamos para o uso consciente ou proibimos?
Pessoas morrem com acidentes com armas (ferramentas de defesa). O que fazemos? A resposta deveria ser coerente com as outras respostas acima.

Os posts da categoria “Respostas Abertas” comentam textos alheios que me chamaram a atenção em alguma rede social. O post original é a parte transcrita em “itálico”. O autor é citado quando possível. Se o texto for seu e não te dei crédito ou você não permite a transcrição, favor entrar em contato.

REFORMA TRIBUTÁRIA

Vejo de volta ao noticiário o tema da CPMF. De novo. Dessa vez turbinada por declaração do Ministro Paulo Guedes e do Vice-Presidente Mourão. Lamentável. Aproveito pra deixar claro minha posição sobre reforma tributária.

O que eu apoio:

  • Extinção de imposto;
  • Redução de alíquota;
  • Alongamento de prazo de pagamento;
  • Simplificação da burocracia de arrecadação.

O que eu sou contra:

  • Criação de novo imposto;
  • Troca de um imposto por outro;
  • Aumento de alíquota;
  • Diminuição de prazo de pagamento;
  • Aumento de burocracia.

Mas, Geraldo, nossa carga tributária é mal distribuída, é injusta, é regressiva, blá, blá, blá, tem que reformular, fazer uma ampla reforma, desonerar isso, cobrar mais daquilo, blá, blá, blá… Não. Quem vem com essa conversa é ingênuo ou tá defendendo algum interesse. Toda vez que se faz alguma reorganização dos impostos a carga total acaba sempre aumentando. Não caio nessa.

Ah, mas, tem que cobrar mais dos mais ricos e das grandes empresas… Acorda. Grandes empresas não pagam impostos. Ricos não pagam impostos. Nunca. Em nenhum sistema. Só coletam e entregam pro governo. Isso quando não recolhem e sonegam. Quem está no topo da pirâmide social ganha dinheiro fornecendo produtos e serviços pra quem tá abaixo. Os impostos vão sendo repassados. Quem paga realmente é só quem tá na base, quem trabalha, recebe salário e gasta comprando coisas pra si e pra sua família. Em qualquer sistema.

Ah, mas, os países desenvolvidos tem carga tributária até maior do que a nossa; O importante é como o dinheiro é usado; Tem é que combater a corrupção; Mas a Suécia, o Canadá, a Terra-do-Nunca… Como os outros países se organizam é assunto deles. Respeito, observo, procuro aprender com eles quando aplicável. Mas, somos brasileiros, vivemos no Brasil, temos de considerar nossas circunstâncias e ver o que funciona aqui. A verdade é que aqui sempre tivemos governos que arrecadam cada vez mais e entregam cada vez menos, independente da ideologia ou do partido. Salvo raras tentativas de brincar de austeridade, sempre tivemos governos que gastam mais do que arrecadam e quando a conta não fecha, dão um jeito de jogar a fatura pros trabalhadores na forma de mais impostos, mais dívida ou mais inflação.

Não podemos mais tolerar aumento de impostos, sob nenhuma desculpa nem sob nenhum artifício. Se você trabalha pra ganhar a vida e defende ou aceita aumento de imposto, melhor seria ir até algum beco suspeito e entregar sua carteira pra um assaltante.